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Testa de Ferro X: a história de um leak

Testa de Ferro X: a história de um leak

Investigação 74
3 Agosto 2022
Filipe Teles

Design de Rafael Medeiros

Filipe Teles
Filipe Teles
Índice

A Uber Files foi com base em 124 mil ficheiros e teve a participação de 40 órgãos de comunicação social. Nós éramos dois jornalistas e connosco trabalhavam duas estagiárias.

Estava a almoçar quando o Ricardo Cabral Fernandes, diretor do Setenta e Quatro, me ligou a perguntar como estava a decorrer a parte final do trabalho sobre Luís Filipe Vieira. Estávamos a um mês do prazo e, na primeira fornada de artigos e episódios do Testa de Ferro, só tínhamos terminado poucas horas antes da publicação.

A minha resposta foi cuidadosa, mas firme. “Se nada acontecer, está a correr lindamente. Não será como da última vez. Mas já sabes como é que estas coisas são”, acautelei.

Passados 40 minutos, estávamos a receber uma nova (e inesperada) fuga de informação de 45 gigas, 30 mil ficheiros, sobre a Promovalor, a empresa de Vieira. Primeiro veio o êxtase, depois instalou-se o pânico. Como íamos analisar 30 mil ficheiros num mês?

Para vos dar um exemplo: a Uber Files foi com base em 124 mil ficheiros, e teve a participação de 40 órgãos de comunicação social. Nós éramos dois jornalistas e connosco trabalhavam duas estagiárias.

Por esta altura a história parecia completa, porém. Já tínhamos percorrido o país de Norte a Sul para conhecer os empreendimentos de Vieira (aqui e aqui), cruzado o Atlântico para ir ver o luxuoso hotel no Recife que a Promovalor erguera com pompa e circunstância exclusivamente com dinheiro do BES (que se encontrava fechado há dois anos e que nunca fez um cêntimo de lucro), e até tínhamos visitado os obscuros cemitérios do negócio da Imosteps, no Rio de Janeiro. O que faltava mais?

Começámos por criar – dezenas, diga-se –  palavras-chave para conseguirmos navegar naquele oceano de 30 mil ficheiros: Ricardo Salgado, Imosteps, Odebrecht, Almerindo Duarte (o sócio de Vieira), Tiago Vieira (filho de Vieira), Sara Vieira (filha de Vieira), Amílcar Morais Pires (o administrador do BES descrito como o mais próximo de Vieira no banco) e por aí fora.  

O @SetentaQuatro recebeu uma tranche de 30 mil ficheiros, 45 gigas de informação vindos do seio da Promovalor - a empresa de Luís Filipe Vieira. Descobrimos uma nova ligação entre o ex-presidente do SLB e o empresário Bruno Macedo. Para ler no 74 a partir de terça-feira. pic.twitter.com/EBFYElmmUh

— Setenta e Quatro (@SetentaQuatro) April 16, 2022

Embora esta fuga de informação fosse 40 vezes maior do que a primeira, já estávamos oleados na pesquisa e análise de grandes volumes de ficheiros. E já dominávamos a história.

Clique. A Britalar, do presidente do Sporting de Braga, António Salvador, esteve para ser parceira da Promovalor no Brasil? Clique. Vieira pensou comprar uma construtora no Recife? Clique. A Promovalor pagou 600 mil euros ao consultor responsável por estabelecer a parceria com a Odebrecht? Clique, clique, clique.

Para qualquer jornalista, esta informação é extasiante, principalmente quando já se está a trabalhar há um ano o tema: detalham, complementam e fortalecem a história. Mas nada que mudasse o percurso e o caminho que o nosso trabalho havia tomado; não era um grande “furo”.

A investigação começou em maio de 2021, antes da detenção de Vieira e da Operação Cartão Vermelho. Pedro Coelho, grande repórter da SIC que coordenou a investigação, havia recebido a documentação – 1000 ficheiros – que serviu de base para as reportagens em novembro de 2020.

O início da Operação Cartão Vermelho, além de nos baralhar as contas, pois tivemos de marcar passo para a história ter impacto na hora certa, definiu, desde logo, o que não queríamos fazer: entrar na parte que dizia respeito ao futebol, que estava a ter maior atenção mediática na altura. Por duas razões: a primeira, porque o valor que alegadamente Vieira havia desviado do Benfica era irrisório (cerca de 2,5 milhões de euros) em relação ao calote de centenas de milhões de euros que havia deixado para os contribuintes portugueses pagarem; e porque queríamos (na verdade, esta ótima decisão foi do Pedro Coelho, muitíssimo mais experiente nestas andanças, pois eu estava excitado pela possibilidade de investigar offshores) afugentar o ruído dos clubismos.

O Ministério Público suspeitava que Luís Filipe Vieira tinha desviado dinheiro de algumas transferências do Benfica no passado. E Bruno Macedo, empresário e agente de futebol, tinha sido crucial nessa artimanha – era o testa de ferro do presidente benfiquista, acreditava o Ministério Público.

Clique. International Sports Fund Limited. Bingo!

Entre várias entidades envolvidas no alegado esquema, o empresário bracarense controlava uma sociedade registada no Delaware, a International Sports Fund Limited, que o Ministério Público acreditava ser, na realidade, de Luís Filipe Vieira. Mas era mais um feeling do Ministério Público, por provar.

E é aí que nos lembramos de uma palavra-chave para procurar no software que utilizámos para navegar pelos documentos. “E se pesquisarmos por Bruno Macedo?”, pensámos. Estava completamente fora do perímetro da nossa história, mas valia a pena tentar. Mesmo que só tivéssemos menos de um mês para trabalhá-la.

Havia, todavia, um ângulo da história que não tínhamos explorado, por falta de tempo e de fontes que se disponibilizassem a falar connosco. Um negócio de Vieira completamente desconhecido dos olhos do público: a K-Tower, um projeto de torres de escritório em Maputo, Moçambique, que Luís Filipe Vieira iria fazer em parceria com antigos parceiros da ESCOM (Espírito Santo Commerce), uma das parcelas mais obscuras do Grupo Espírito Santo.

As únicas informações que tínhamos sobre este negócio – escutas – estavam perdidas nos confins da Operação Marquês, um processo que tem como alvo principal o antigo primeiro-ministro José Sócrates. 

Nos 30 mil ficheiros, tínhamos praticamente tudo sobre a K-Tower: estudos fiscais, business plans, emails, faxes, balanços de despesa, atas, vídeos de apresentação do negócio, fotografias, etc.

Colocámos, finalmente, o nome de Macedo no motor de busca do software. O primeiro resultado entusiasmou-nos imediatamente: encontrámos uma folha de Excel com os balanços de despesa da Promovalor, onde constava uma viagem de Tiago Vieira e Bruno Macedo ao Dubai. Bruno Macedo, check.

A próxima palavra-chave era óbvia. A Astro Sports Management era outra sociedade controlada por Bruno Macedo que o Ministério Público acreditava que o empresário utilizava para desviar dinheiro de comissões de transferências de jogadores do Benfica, de forma dissimulada para as empresas de Vieira. Óbvia porquê? Porque era única empresa indicada pelo Ministério Público como estando registada no Dubai.

Clique. Nada.

Foi então que nos lembrámos de experimentar International Sports Fund Limited. O software indica-nos para vários rascunhos de contratos de empréstimo. Começa por aparecer: International Sports Limited, Sports International Limited e “Promovalor Related Vehicle”. Clique. International Sports Fund Limited. Bingo!

A International Sports Fund Limited, segundo os documentos a que tivemos acesso, tinha sido utilizada para financiar, numa primeira fase, a parte de Vieira no projeto K-Tower. Encontrámos o testa de ferro do Testa de Ferro.

Eaglestone
Testa de Ferro IX: Vieira usou uma sociedade de Bruno Macedo para financiar um projeto em Moçambique
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Testa de Ferro VIII: Moçambique e as maravilhas do camarote do Benfica
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Cemitério Imosteps
Testa de Ferro VII: o cemitério de Benfica
Nuno Gaioso Ribeiro
Testa de Ferro VI: Como a dívida de Vieira bateu no fundo
Odebrecht
Testa de Ferro V: À conquista do Brasil com dinheiro do BES

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