Em 2023, o Setenta e Quatro voltou a rondar um milhão de visitas. O balanço deste ano não deixa de revisitar um dos maiores esquemas de burlas mundiais com ligações às empresas de Vale e Azevedo, as grandes falhas no acesso a direitos constitucionais e uma investigação sobre a violência sexual em contextos médico-hospitalares. Com o ano prestes a terminar, destacamos os dez artigos mais lidos em 2023.
Vinda diretamente dos Estados Unidos e com milhões de euros faturados à custa dos mais indefesos, o Setenta e Quatro investigou as ligações de Portugal numa das maiores burlas do mundo: a Maria Duval. Era uma misteriosa vidente que prometia serviços de vidência, amuletos e toda a espécie de serviço esotérico. Tudo a troco de dinheiro.
Neste artigo explicamos todos os esquemas e maquinações desta burla mundial que, no caso português, foi montada nos anos 1990 a partir de uma rede de empresas. O grande impulsionador foi João Vale e Azevedo, que angariou os nomes de várias figuras poderosas.
A luta pelos direitos laborais dos médicos em Portugal tem sido cada vez mais assídua e reivindicadora. E este ano foi reflexo disso. Bruno Maia, médico neurologista e intensivista, desconstrói a propaganda de António Costa sobre o investimento no Serviço Nacional de Saúde, que se tem focado em pagar às instituições privadas, e nas carreiras dos médicos.
No seu entender, a estratégia do governo foi apostar no desgaste da imagem dos médicos, o que nos transporta para o panorama vivido na última década: os médicos perderam um quarto do salário e a atualização das carreiras tem ficado muito aquém.
A 1 de abril de 2023 as ruas encheram-se de dezenas de milhares de pessoas. O descontentamento perante a crise de habitação era claro, tocando na população de um modo direto e provocando sufoco. O objetivo era óbvio: lutar pelo direito a uma habitação digna. Mas esta manifestação pacífica, tanto quanto se esperava, deu azo a confrontos com agentes da PSP por causa de uma sucessão de erros básicos de um Comissário da PSP jovem e inexperiente.
Não fosse a gravidade dos eventos e dir-se-ia que seria um bom cenário educativo. A PSP poderia aproveitá-lo para as suas aulas na academia, alerta Francisco Carvalho, quando nos escreve sobre o assunto. Neste ensaio contou-nos o que aconteceu ao pormenor naquele domingo.
As casas autoconstruídas de Maria, Daisy e Ivânia foram demolidas pela Câmara de Loures em março. Cinco meses depois, estas três mulheres viviam com os seus bebés em quartos de pensão insalubres e sem condições. Neste artigo, o Setenta e Quatro mostrou a profunda crise de habitação que se vive há anos. Há décadas que milhares de pessoas são obrigadas a construir as suas próprias casas por falta de alternativas.
O IRA tem-se assumido como organização de vanguarda na defesa dos direitos dos animais. A convocatória para uma manifestação contra a decisão de inconstitucionalidade da lei protetora dos animais pelo Tribunal Constitucional foi reflexo disso. O IRA assinou um protocolo com os Bombeiros de Camarate - que tanto os Bombeiros Voluntários como o IRA se recusam a divulgar - e recebeu formação do ICNF com o objetivo de fazer uma parceria com a Câmara de Loures.
Neste enfoque explicamos como um dirigente local do PS e um ex-candidato autárquico do Chega foram essenciais para se abrir portas ao grupo animalista conotado com a extrema-direita e marcado pelo secretismo e vigilantismo.
Rubens Gabriel Prates entrou na esquadra do Martim Moniz, em Lisboa, por volta das 10 horas da manhã. Oito horas depois entrou no hospital com escoriações nos dois braços, dores agudas nas pernas e suspeita de fratura no braço esquerdo. Foi enquanto aguardava por uma entrevista de emprego na Mouraria, que vários polícias o deitaram ao chão e o detiveram. Levaram-no para a esquadra da PSP do Martim Moniz. O jovem brasileiro foi esmurrado, pontapeado e forçado a pôr as suas mãos em cima de uma mesa, onde lhe bateram com os cassetetes até que assinasse uma autorização de busca à sua casa. Contamos detalhadamente a história de Rubens.
As publicações do presidente da Câmara de Lisboa no Instagram saltaram subitamente das centenas de “likes” para as dezenas de milhares. Alguns dos seus vídeos na rede social têm mais “likes” do que visualizações. A página de Carlos Moedas tornou-se um sucesso de interações na rede social. Foi de tal forma um sucesso que os seus pequenos vídeos (reels) têm mais “likes” que visualizações. Como se pode explicar estes fenómenos? Com a intervenção de bots para alavancar a conta. Explicamos como este processo foi feito e existe em várias publicações do atual presidente da Câmara de Lisboa.
Ao longo de um ano conversamos com 47 mulheres que denunciaram e contaram aquelas que foram as experiências mais traumáticas das suas vidas: sofreram abusos sexuais (coação e violação) dentro de hospitais e consultórios, por médicos, enfermeiros e assistentes operacionais. Vivem até hoje com esse trauma. Como é que isto aconteceu ao longo das últimas duas décadas? Quais as falhas do sistema? Da Justiça? Dos Hospitais? Esta investigação de quatro artigos responde a todas estas questões e escuta e retrata, na primeira pessoa, a história de todas estas mulheres.
A investigação não só foi apoiada com a bolsa Gender Equality da Pulitzer Center, como permitiu ao Setenta e Quatro ser o primeiro órgão de comunicação português sem fins lucrativos a ganhar a bolsa norte-americana.
Mamadou Ba começou a ser julgado a 26 de abril. Foi acusado pelo neonazi Mário Machado de calúnia e difamação por supostamente o ter acusado no Facebook de ser um dos assassinos de Alcindo Monteiro, em 1995. A 20 de outubro deste ano o ativistas antirracista foi condenado a uma multa de 2.400 euros resultante desta mesma acusação.
O Setenta e Quatro conversou com o ativista ainda antes do julgamento terminar. Mamadou Ba denunciou que o seu julgamento faz parte de uma estratégia que usa a Justiça para silenciar o antirracismo e fortalecer narrativas racistas.
Em meados da década de 2000, Pedro Arroja tornou-se diretor executivo de uma empresa de investimentos de risco em ativos financeiros. Os investimentos acumularam-se e a maioria dos investidores particulares limitava-se a assinar e a depositar o seu dinheiro para que o gestor de carteira o fizesse render. Assim que estalou a crise financeira de 2008, a empresa registou uma queda de 350 mil euros anuais.
Os contratos com os investidores foram rescindidos unilateralmente, à revelia da lei e 20 pessoas foram lesadas em milhares de euros. O seu dinheiro esfumou-se. A CMVM não soube, o Banco de Portugal não tinha de saber, os clientes não foram informados e Pedro Arroja nunca foi responsabilizado.
Neste artigo explicamos o que falhou na intervenção das instituições e na ação das empresas do economista, professor universitário e mandatário nacional do CHEGA para as eleições legislativas de 2022.