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Costismo Lusitano, o Farol Do Socialismo Na Europa

Tenho de concordar com os nossos comentadores de direita: o socialismo em que vivemos é perigoso. É perigoso para os que querem manter a pobreza e desigualdade em Portugal. É perigoso para a direita mostrar aos portugueses que existe alternativa ao terror austeritário de Passos Coelho, Paulo Portas e Troika. É perigoso mostrar que o socialismo funciona.

Crónica 74
3 Agosto 2023

Por muito que custe à reação - pinte-se ela de liberal, conservadora, social democrata ou até aventureirista de esquerda - é impossível negar as vitórias do socialismo realmente existente em Portugal sob a liderança do Grande Timoneiro, o camarada António Costa.

À medida que nos aproximamos do oitavo aniversário da revolução socialista que permitiu acabar com o reino de terror austeritário de Passos Coelho, Paulo Portas e da Troika, em que o povo levou as esquerdas ao poder por aclamação, convém lembrarmos as vitórias que o proletariado português conquistou nestes anos.

Embora reconheçamos as contribuições do Partido Comunista Português, do Partido Ecologista ‘Os Verdes’ e do Bloco de Esquerda nos primeiros quatro anos da revolução, denunciamos o oportunismo do “esquerdismo”, doença infantil do socialismo, que desmerece vitórias concretas e realistas do Costismo enquanto embevecidos pelo furor da revolução tentam vender ideias utópicas para usurpar o poder cedido ao Partido Socialista pelo povo.

Era inevitável que na situação em que Portugal se encontra, sitiado por inimigos imperialistas externos e os seus agentes internos, que estes partidos tenham sido ilegalizados. Afinal, não há maior aliado da causa reaccionária que o “esquerdista” pequeno-burguês que confunde a sua desilusão com a falta de protagonismo que achava que ia ter na revolução com o falhanço da revolução em si. Mas é também uma vitória do Partido Socialista que muitos dos seus membros tenham visto a luz depois de se voluntariar para serem reeducados nos campos de cultivo de Odemira e tenham ressurgido, como eu, dos mais fervorosos defensores do Costismo Lusitano.

Já a oposição de direita elogia o trabalho do Partido Socialista com cada crítica. Acusam António Costa de ser um perigoso marxista e é verdade. As políticas socialistas que prosseguiu são um perigo para quem quer manter a pobreza e a desigualdade em Portugal. Acusam António Costa de prosseguir uma agenda comunista e é verdade. Depois de Marx, Engels e Lenine, espero ver o busto de António Costa no próximo desfile militar do 25 de Abril.

Comecemos pelas cidades, onde, contra os interesses de senhorios, especuladores imobiliários e o alojamento local, recuperou anos de atraso na política de habitação pública. Copiando os melhores exemplos como “Viena Vermelha”, o estado português criou uma construtora civil pública (CCP). Afinal, não é como se fôssemos esgotar as obras públicas necessárias em Portugal. 

Entre a CCP e privadas contratadas por concurso público passámos da construção de uns míseros 67 fogos de habitação pública de 2012 para 2015 para 12 mil fogos de habitação pública por ano. Além de praticamente duplicar a construção de habitação em Portugal, o Estado português iniciou um agressivo programa de incentivo ao aproveitamento das quase 730 mil casas devolutas em Portugal.

Desde incentivos ao arrendamento acessível, agravamentos fiscais a grandes proprietários a expropriação em casos extremos como o de negligência completa ou posse por fundos imobiliários. Esta nova lógica dos direitos humanos acima dos direitos da propriedade permitiu mudar o foco de “habitação social” - estigmatizada, reduzida a “bairros sociais” segregados do resto da população - para “habitação pública”, integrada em todas as cidades, vilas, bairros não apenas para pessoas marginalizadas mas para jovens à procura da primeira casa, reformados e casais da classe média. Isto teve um efeito dramático na procura de casas.

O mercado imobiliário colapsou, as rendas baixaram e as casas perderam valor, para júbilo da população. Na habitação pública o inquilino paga consoante as suas posses. Alguns podem ter a sua renda completamente comparticipada, desde pessoas antes em condição de sem-abrigo até médicos, enfermeiros, professores e outros funcionários públicos, como incentivo para se relocalizarem para regiões com carências dos mesmos.

A classe média e trabalhadora passou de perder mais de metade do rendimento em rendas e empréstimos para menos de um terço. As populações puderam regressar da periferia cortando milhares de horas no trânsito. O rendimento adicional criou um boom nos serviços, consumo e cultura que resultou no maior crescimento económico de Portugal. 

A colecta de impostos, muito mais focada no capital, nos grandes grupos económicos e nos portugueses mais ricos, atingiu recordes. Com estes fundos fizeram-se importantes reformas na Saúde e na Educação que estavam em falta. A mais arriscada de todas foi quando o Estado passou a cobrar multas por crimes ambientais, poluição, infrações de direitos laborais e práticas concorrenciais desleais em ações da empresa.

Isto não só evitou que as empresas passassem o custo das multas para o consumidor, como serviu um grande propósito socialista: entregar ao povo português e aos trabalhadores um voto na economia. Juntamente com o Plano Medina atingiu-se um nível de democracia no trabalho nunca antes visto em terras lusas.

A democracia no trabalho foi uma prioridade. Com os incentivos fiscais e proteções legais, além de campanhas de sensibilização, atingiram-se níveis de sindicalização acima dos 50%. 

Com a Caixa Geral de Depósitos (conhecido hoje como Banco do Povo) fomentou-se a cooperativização. O Banco do Povo rovidenciou capital para se fundarem novas cooperativas, mas também para que os trabalhadores possam comprar as suas próprias empresas, cooperativizando-as. Também renasceram várias empresas como cooperativas com a nova Lei Mendes Godinho, que permite a trabalhadores de empresas falidas comprarem a empresa com as indemnizações que receberiam do fundo de desemprego.

Mais notável ainda foi o PS ter finalmente corrigido os seus erros históricos trazendo de volta para controlo público empresas como a ANA, a Groundforce, os CTT, a REN, a EDP, que tinham sido privatizações desastrosas. Com o controlo público, melhoraram os serviços, baixaram os preços e os dividendos passaram a ficar em Portugal, aliviando os impostos. Criou a TP (Telecomunicações Populares) para garantir o acesso à internet de alta velocidade como direito universal - com um plano mínimo gratuito para quem precisa. A instalação avança lenta mas inexoravelmente, mas o investimento em infraestrutura criou milhares de empregos.

Outra das revoluções socialistas foi precisamente no trabalho: um emprego público para quem quisesse. Com a necessidade de concorrer com o público em salários e condições melhores, os salários subiram no privado. Com a subida dos salários a economia foi obrigada a redirecionar-se de sectores com baixa produtividade e dependentes de baixos salários para sectores altamente rentáveis e sofisticados tecnologicamente - com um pouco de ajuda de investimento público.

E não faltaram empregos: desde a construção da nova infraestrutura da internet, ferroviária, habitação pública a milhares de empregos nos cuidados, creches e lares públicos, universais e gratuitos, que estavam tanto em falta. Na Saúde e na Educação contrataram-se os profissionais que faltavam. Combateu-se a escravatura moderna não só enfrentando a precarização, dando amplos meios para a ACT para fiscalizar e responsabilizar empresas e patrões que lucrem de trabalho precário ou escravo.

Na importantíssima frente de batalha do ambientalismo, o controlo público da energia permitiu um investimento enorme na transição energética, na ferrovia de alta velocidade - substituindo os voos de curta duração - e reduziu o uso do carro privado nas cidades com investimento no reforço dos transportes públicos e na mobilidade leve. Chato para quem quer vender carros e gasolina, mas bom para quem quer esperar menos que 5 minutos por um metro com muito espaço.

A redução da dependência da dívida externa, alicerçada no fortalecimento dos certificados de aforro e títulos do tesouro, retirou grande parte do poder disciplinador do capital. Não ficámos mais reféns dos mercados financeiros e ganhámos liberdade para prosseguir as políticas que o povo escolheu.

Factores como o fim dos chamados “bairros problemáticos” e a integração total das escolas, além do declínio da imprensa sensacionalista com o novo modelo comunitário de imprensa, reduziu-se a percepção da necessidade de policiamento e pôde-se focar a perspectiva numa justiça restauradora e integradora, reduzindo a população prisional.

Na política externa, não podia deixar de prosseguir uma política condizente com os valores constitucionais de solidariedade e fraternidade entre povos, anti-colonialista e anti-imperialista, contra uma política de blocos político-militares. Finalmente reconheceu a Palestina, estabelecendo relações diplomáticas com o país e enviando ajuda humanitária contra o apartheid. Recebemos refugiados de braços abertos e fomos recompensados com a sua gratidão. 

Não posso deixar de admirar a coerência das posições de veto na União Europeia nos tratados comerciais, garantindo que não passam sem os direitos laborais e exigências ambientais mínimas estarem garantidas.

Certamente podia ter falado de outras áreas, como da cultura, do investimento colossal na indústria cinematográfica, televisiva, musical e de jogos, liderado pelo camarada Pedro Adão e Silva. Na produção de animação, documentários, filmes e séries portuguesas dando voz a milhares de escritores e artistas. No apoio ao desporto escolar e comunitário. As coisas que se conseguem fazer quando deixa de se financiar com dinheiros públicos touradas.

Percebo a revolta da direita: provou-se que um mundo melhor era possível. Que não era a “natureza humana”, mas a natureza do sistema, da falsa escassez para alimentar a ganância de poucos, que estava a virar homens contra mulheres, trabalhadores contra trabalhadores, a manter artificialmente a pobreza viva em Portugal.

Como tudo isto definitivamente aconteceu não tenho como não concordar com os nossos comentadores de direita, com os nossos dirigentes da direita (todos a falar do exílio, obviamente): vivemos no socialismo, o António Costa tem uma agenda marxista, as suas políticas são comunistas, tomou a posse dos meios de produção e deu aos trabalhadores.

Mas, imaginemos por um momento, uma história alternativa. Uma em que o PS, depois dos acordos parlamentares com o BE e PCP, implementou medidas populares de reversão da austeridade do PSD/CDS/Troika e recuperou rendimentos, mas depois de rejeitar novos acordos, de recusar negociar um orçamento com a esquerda, de provocar eleições antecipadas e conseguir uma maioria absoluta, continuasse uma política de austeridade encapotada, de cativações, de orçamentos anunciados mas não executados, de estagnação de salários face à inflação galopante, de manter vistos gold e alojamento local, de baixar impostos em vez de regular preços… imaginemos que esse PS, que não fez nada das coisas que elogiei aqui, fosse acusado de “socialista” e “marxista”. Não seria absurdo?

Felizmente vivemos hoje os amanhãs que cantam! Em frente com a revolução, camarada Costa!

O autor escreve consoante o Acordo Ortográfico de 1990, porque o pai, e cito, “não quer que ele escreva como o Salazar”.

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