Tem um doutoramento em Ciências da Comunicação pela Universidade Nova de Lisboa. Dá aulas na FCSH-Universidade Nova de Lisboa e na Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias. A sua investigação centra-se em não-monogamias consensuais, BDSM, género e sexualidades e ciberculturas. 

A Criança Cidadã e a Criança-Objeto, ou Da Parentalidade como Omnipotência

Como se considera a figura da Criança como incapaz, incompleta e não-verdadeiramente-Cidadã, é preciso reduzi-la a Criança-Objeto. Objeto e veículo de preocupações de adultos sobre adultos para adultos. E quando crescem em desalinhamento com os planos de heterossexualidade reprodutiva cisgénero, segue-se o sofrimento, a incompreensão e, às vezes, a morte.

Ensaio
19 Maio 2022
[Aviso a pedido de autore: este ensaio contém referências a transfobia, suicídio]

Desde o início de 2020 que Portugal discute, aos soluços e solavancos, as sortes e azares de dois estudantes de Famalicão que chumbaram por faltas à disciplina de Cidadania e Desenvolvimento. Não por terem preguiça de assistir às aulas, mas porque os pais bloquearam, conscientemente e em plena noção do impacto que iria ter sobre os seus filhos, o seu acesso aos recursos educativos da Escola.

Não tenhamos ilusões: decidir se es filhes vão à escola ou não é enquadrado como bom ou mau dependendo do contexto étnico-racial e de classe. Quando se trata de minorias étnicas e grupos racializados, a comparência na escola é uma espécie de ‘vitória civilizatória’, e é notícia por si só (embora recomende caução a quem seguir esse link e for olhar para os comentários). 

Por outro lado, quando se trata de violar o direito à educação de jovens de um meio privilegiado e conservador, é afinal uma suposta ‘vitória parental’. Tanto assim é que esses mesmos pais se dão ao luxo de “não [dar] autorização à CPCJ [Comissão de Proteção de Crianças e Jovens] para agirem”. Imagine-se o furor que se instalaria no comentariado mediático nacional se uma família pobre e racializada decidisse que não queria a CPCJ metida ao barulho num caso de violação de direitos da Criança!

Dependemos de quem nos lê. Contribui aqui. 

A grande questão aqui, no entanto, não tem que ver com o conceito de Cidadania em abstrato, mas com as temáticas de igualdade de género e educação sexual que, dizem estes pais, provocam “especiais preocupação e repúdio” – embora também defendam que o restante da disciplina seja uma “perda de tempo”. Que temas, afinal, são estes que os pais dizem ser tão irrelevantes? Tão-somente direitos humanos, desenvolvimento sustentável, literacia financeira, participação democrática, mundo do trabalho ou até, horror total!, segurança rodoviária, entre outros.

Note-se: vivemos em pleno século XXI, vivemos em plena crise climática global, e rodeiam-nos constantes violações de direitos humanos, vivemos à sombra – e à beira – de crises financeiras passadas e futuras. Mas capacitar jovens para lidar com estes e outros problemas parece transformar-se, em si mesmo, no problema.

Não tenhamos ilusões: decidir se es filhes vão à Escola ou não é enquadrado como bom ou mau dependendo do contexto étnico-racial e de classe.

Esta narrativa não é nova, como não é nova a análise da mesma. Sara Ahmed tem um brilhante texto de 2010 em que analisa este mesmo fenómeno: quem chama a atenção para um problema torna-se, em virtude de o ter feito, alvo de acusações sobre ser o problema. Como o proverbial elefante na loja de porcelana, há um qualquer pensamento mágico por detrás da ideia de que as coisas más só acontecem se lhes prestarmos atenção. (O que, claro, levanta automaticamente a questão: quem se pode dar ao luxo – quem tem o privilégio – de conseguir ignorar essas coisas más?)

Nesta situação, como em muitas outras, é importante olhar os silêncios além dos  discursos. Um paradigmático exemplo disto é a forma como a própria apresentação pública de alguns dos intervenientes do caso nos ajuda a compreender as dinâmicas existentes. Olhe-se para o minuto 01:04 e seguintes desta entrevista e ver-se-á um daqueles exemplos que se usa em sala de aula quando se está a ensinar estudantes a analisar imagens nos media

O jovem, diretamente afetado por toda esta situação, está em segundo plano, em silêncio e no que faz lembrar a posição militar de descanso, olhando atentamente para o pater familias, a quem cabe o direito (e dever?) de falar sobre, falar por, mas nunca falar com. Existe para ser visto, não ouvido.

Crianças cidadãs?

É aqui que se joga uma das questões fundamentais: há uma tensão de base entre, precisamente, o conceito de Cidadania (e de direitos e deveres associados a ela) e o conceito de Criança – tal como são pensados e levados a cabo na nossa sociedade. Se a ideia de Cidadania se prende com autonomia, reflexividade crítica e capacidade de agir no mundo e com o mundo, a ideia de Criança que temos cultivado ao longo dos últimos séculos prende-se com o conceito de lacuna. 

Ou seja, a figura da Criança é geralmente definida pela negativa, pelo que não é ou não tem – especificamente autonomia, reflexividade crítica e capacidade de agir no mundo e com o mundo. Note-se que dizer isto não é o mesmo que dizer que crianças e pessoas adultas ocupam exatamente as mesmas posições, que têm exactamente as mesmas características. É apenas dizer que, de certo modo, o nosso entendimento (normativo, simplista) da figura cultural da Criança pode ser resumida como "não-adulta", sendo o seu papel o de cumprir um caminho teleologicamente pré-ordenado que desemboca na adultície (vide Harry Blatterer).

Neste sentido, então, é claro compreender como a discussão em torno destes jovens estudantes de Famalicão parte dessa não-adultície para perguntar: a quem cabe o direito de decidir sobre as vidas das crianças? O direito de decidir sobre, e não o dever de acautelar por. Ou seja, quem tem o poder de gerir o objeto político que é constituído pela figura da Criança. O confronto deixa de ser sobre – para usar uma famosa expressão – o “superior interesse da criança”, e passa a ser sobre o exercício do poder discricionário sob a égide da ideia de “Educação”.

Se a ideia de Cidadania se prende com autonomia, reflexividade crítica e capacidade de agir no mundo e com o mundo, a ideia de Criança que temos cultivado ao longo dos últimos séculos prende-se com o conceito de lacuna. 

Não quero aqui estabelecer uma falsa dicotomia que colocaria a Escola como espaço de liberdade e afirmação de direitos, e o espaço da parentalidade como locus de opressão ou recusa e silenciamento. Tanto um como outro são espaços que podem ser entendidos como ortopédicos (é aqui saliente a ilustração que o filósofo francês Michel Foucault decidiu usar quando falou da Escola) ao procurarem formar sujeitos com uma determinada conceção sobre qual deve ser a verdadeira ou correta forma que essa subjetividade deve tomar.  Justamente porque, como diz Nancy Lesko, a pessoa jovem é geralmente entendida como “problemática, fora de controlo […] e, concomitantemente, a necessitar de controlo por parte de outros”. 

Não parece ser do interesse destes pais retirar os filhos da escola, ou tomar para si a responsabilidade de os educar de forma exclusiva. Muito pelo contrário, avaliando pelos excelentes resultados que ambos obtiveram nas outras disciplinas. Esta posição vai um pouco mais longe, ou mais fundo: a Educação é então uma responsabilidade das estruturas da comunidade, mas sob a égide principal ou exclusiva dos pais, e as sensibilidades ideológicas privadas dos pais devem ser o ponto de apoio para as decisões curriculares.

Quer do lado da Escola quer do lado dos “pais preocupados” há, evidentemente, uma visão em conflito sobre qual deve ser a experiência normativa de educação a dar a jovens. Esta geralmente divide-se entre considerar a Educação como um papel ou dever da comunidade (vertida na figura do Estado e portanto do sistema público de educação) versus como um papel ou direito da Família (vertida geralmente na figura dos progenitores). 

O expoente máximo desta clivagem está, na verdade, vertido em Lei, e é geralmente conhecido como ensino individual ou ensino doméstico. Note-se que, mesmo neste sistema de ensino, continua a existir uma provisão de acompanhamento e estandardização do que é ensinado e de quais as competências que é suposto serem adquiridas por quem recebe a sua educação desta forma.

No entanto, não parece ser do interesse destes pais retirar os filhos da escola, ou tomar para si a responsabilidade de os educar de forma exclusiva. Muito pelo contrário, avaliando pelos excelentes resultados que ambos obtiveram nas outras disciplinas. Esta posição vai um pouco mais longe, ou mais fundo: a Educação é então uma responsabilidade das estruturas da comunidade, mas sob a égide principal ou exclusiva dos pais, e as sensibilidades ideológicas privadas dos pais devem ser o ponto de apoio para as decisões curriculares.

Para uma cidadania genderizada e sexualizada

Porém, será esta uma boa descrição do que se está de facto a passar? Não creio. A ser essa a linha de coerência postulada pelos pais destes jovens, então também se veria a sua possível influência noutras áreas (será que estes pais gostam que se fale de Karl Marx em História?... tenho as minhas dúvidas, mas ignoro qual possa ser a sua posição). É preciso então olhar-se mais de perto para os elementos específicos a que estes pais se opõem, e qual a sua relação com outros tipos de conteúdos.

Considero particularmente elucidativa a peça de opinião sobre o tema publicada no início de fevereiro de 2022 – sobre educação, género e sexualidade por parte de um especialista em Direito Empresarial… –  na qual se articula explicitamente a tal conceção de Criança que criticava acima. Esta concepção da criança cria uma separação entre “ciências exatas” e “ideias opináveis, sobretudo nas matérias que não formem parte do núcleo de princípios estruturantes da vida em sociedade, fundamentais para a prossecução do bem comum”. 

Esta frase poderia, por si só, dar toda uma tese. Porém, em nome da brevidade quero destacar dois elementos que me parecem fundamentais. O primeiro (e curiosamente o mais sintomático mas menos complexo) é o de considerar que “Cidadania e Desenvolvimento” – ou, lê-se nas entrelinhas, igualdade de género e educação sexual – não é parte do “núcleo de princípios estruturantes da vida em sociedade”.

Num mundo em que o Índice de Igualdade de Género português é vergonhosamente baixo no contexto europeu, e em que a violência contra pessoas LGBTQI+ perpetrada por pessoas jovens é ainda galopante, dizer tal coisa é mais do que ter uma opinião controversa. É antes de mais fazer uma afirmação factualmente incorreta alegando-se que o bem comum não pode estar a ser defendido ou respeitado quando uma quantidade substancial da população se encontra sob ameaça e violência (física, verbal, emocional e simbólica). 

É, no fundo, considerar que algumas das estruturas mais fortemente vinculadas com a transmissão e exercício de poder, tanto a nível formal como informal, como são o género e a sexualidade, devem ser entendidas como secundárias, dispensáveis e, no fundo, privadas - ouçam os ecos da frase de má memória, “entre marido e mulher ninguém mete a colher”.

A Ciência, as ciências

O segundo ponto de nota é porventura mais insidioso, uma vez que depende da produção de uma diferença epistémica entre “ciências exatas” e “ciências sociais” (ou não-exatas). O que quero dizer com a produção de uma diferença? Não vou negar as diferenças epistémicas entre ciências exatas e sociais, embora também não queira tratar a questão como sendo irrelevante.

O que quero aqui dizer é que questões sobre igualdade de género ou orientação sexual são remetidas para o campo da opinião, da não-factualidade, da tese filosófica, do thought experiment, ao passo que a Física, a Química e afins são-como-são-e-acabou (mesmo que não seja de facto assim que a ciência ‘exata’ funciona).

Ou seja, nada têm a dizer sobre questões de género e de saúde sexual (quem diria, já agora, que a Medicina – presente em saúde sexual – tinha sido relegada a matéria de opinião entre o comentariado conservador, mas talvez isso explique o quanto por aí grassam as teorias da conspiração que temos visto nos últimos dois anos).

Ora, há aqui vários problemas. Em primeiro lugar, a ideia de corpos binariamente sexuados não é algo apoiado empiricamente nem pela Biologia (inclusive no campo da Genética), nem pela Medicina. Em segundo lugar, a existência de várias identidades de género não são reduzíveis nem compatíveis com o binómio homem/mulher. (Aqui está um exemplo da América do Sul, mas poderíamos ficar o resto do tempo a explorar as várias dezenas de exemplos conhecidos, e imaginar quantos mais não se terão perdido para a História e para a destruição de culturas inteiras durante a expansão colonial europeia).

Portanto: produz-se uma diferença epistémica entre factos indiscutíveis (que supostamente só apoiariam uma visão binária de sexo e de género) e opiniões e posições construtivistas (somente dentro das quais seria possível postular algo não-binário) baseando-se na ausência dessa separação de facto. 

Querer uma disciplina de Ciências da Natureza que fale apenas de homens e mulheres (fisiológica, genética e hormonalmente) é na verdade atentar contra os dados mais recentes das ciências exatas, e não defender as ciências exatas. Considerar que não existe uma ligação causal direta entre estes fenómenos biofisiológicos e o género que uma pessoa possa ter não é especular filosoficamente, é sim respeitar os dados empíricos recolhidos diretamente pela Antropologia, a Sociologia e a História. 

No fundo, nada há de mais “ideológico” do que negar a existência de pessoas transgénero ou de pessoas LGBQI+ - embora a palavra certa não seja “ideológico”, mas “especulativo”.

Aquilo a que o comentador chama de “ideias [que] não podem ser apresentadas como as únicas [ou] como factos” são, na verdade, factos que não podem ser apresentados como meras ideias. E se a preocupação é articulada em torno do risco do ‘pensamento único’, que se descanse o comentador e quem a seu lado se melindra: não faltam manuais de todas as outras disciplinas que falam (às vezes contra-factualmente, mas nem sempre) de homens e mulheres.

Poder sobre a Criança

Não obstante, há algo ainda que fica por explicar. Expor a contradição e o exercício retórico associado à produção de uma falsa equivalência entre factos (conservadores) e opinião (LGBTQI+) não resolve nem incorpora o supracitado confronto sobre quem deve educar com base no quê. Dito de outra forma: por que é tão polémica esta questão, tanto dentro como fora dos tribunais e dos jornais? Ou, dito de outra maneira, se a gestão da figura da Criança, dos seus direitos e da sua educação é um processo de exercício de poder, quem ganha com isso e por que parece este nexo (da educação sexual e da igualdade de género) tão particularmente mobilizador?

É preciso recuar um pouco – até ao século XVIII – para compreender que a sociedade europeia tem vindo a desenvolver uma peculiar obsessão com aquilo a que Sigmund Freud viria a chamar de “sexualidade infantil”. Os atos vistos enquanto sexuais por parte de crianças (como a exploração do próprio corpo, que qualquer pediatra com credenciais reais atualmente diria ser perfeitamente normal) eram investidos de preocupações de saúde. Mas, mais do que isso, eram vistos como potencial risco de saúde pública

Isto quer dizer que a sexualidade infantil começou, há um par de séculos a esta parte, a ser entendida como uma fase particularmente frágil e perigosa – não tanto para as crianças em si, mas para a heteronormatividade vigente na sociedade.

Esta obsessão histórica com a “sexualidade infantil” foi fundamental para a instauração do que Foucault chamou de “dispositivo de sexualidade”: um sistema de produção de subjetividades e modos disciplinares em torno do comportamento sexual e da organização sexual e genderizada de toda a sociedade.

Ora, esse mesmo dispositivo de sexualidade é onde podemos encontrar a origem histórica da patologização pseudo-científica (mas considerada propriamente científica à data da sua publicação) da homossexualidade, a patologização pseudo-científica de pessoas transgénero, de pessoas com interesse em BDSM, e muitos outros comportamentos. Ou de todos os outros comportamentos que não envolvessem um pénis a penetrar uma vagina com o objetivo de procriar (o que, curiosamente, não deve ser confundido com “heterossexualidade” que, à altura, era também definida como sendo uma forma de patologia em vários dicionários).

Isto quer dizer que a sexualidade infantil começou, há um par de séculos a esta parte, a ser entendida como uma fase particularmente frágil e perigosa – não tanto para as crianças em si, mas para a heteronormatividade vigente na sociedade. Horror dos horrores: imagine-se o que aconteceria à sociedade se as pessoas adultas não se unissem todas e tentassem forçar (explicitamente e implicitamente) a heterossexualidade enquanto forma única de viver a sexualidade! (Aviso à navegação: atente-se na ironia da última frase.)

Claro que, como bem explicam várias obras famosas (incluindo o Gender Trouble de Judith Butler) – e como o comentarista acima deverá concordar, bem como a família dos dois jovens em questão, curiosamente – a sexualidade e o género estão conceptualmente associados. 

Afinal de contas, para dar um exemplo simples, a orientação sexual é geralmente definida pelo género da própria pessoa e das pessoas por quem ela se sente atraída. Isto quer dizer que a manutenção da heteronormatividade é também a manutenção da cisnormatividade. Não estou a divagar de forma teórica, desligada da realidade: basta ver como a maioria dos contos tradicionais em circulação são fundados em pressupostos heterossexistas, e como a diferença é tida como negativa, para perceber as diferenças de representação e validação social.

Criança-Objeto versus Cidadania

Assim se compreende, por fim, a problemática em torno dos jovens de Famalicão. A Criança, enquanto superfície-objeto que carrega em si o futuro projetado pela heteronormatividade, está sob ataque – sob risco de ser contaminada pela diversidade sexual – e portanto, em nome da Criança, mas verdadeiramente em nome da sociedade heteronormativa, é preciso resguardar a Criança desse contágio… 

Sim, estamos no século XXI e, ao mesmo tempo que uma parte da sociedade se dedica a fazer de conta que um certo vírus não existe, outra parte dedica-se a considerar que as ideias e as sexualidades são como um vírus – transmissíveis, patológicas.

E é aí que encontramos a lógica subjacente a essa recusa da Cidadania: porque a cidadania plena, a cidadania completa e potenciadora da ação humana em sociedade e para a sociedade, é uma cidadania que requer reconhecimento. Exercer cidadania é exercer o direito a que as outras pessoas nos reconheçam, e é exercer a obrigação de reconhecer as outras pessoas; de que as nossas pertenças sejam reconhecidas, e de reconhecer as pertenças de outrem. Um “bem comum” fundado na manutenção de fronteiras e violências entre o Nós e o Outro não é um bem comum de facto – é um bem parcelar.

Os jovens de Famalicão têm pais ciosos, não do seu superior interesse, mas do superior interesse da Criança – da Criança abstrata, campo fértil da produção e reprodução social da ordem heterossexual-patriarcal vigente. O seu reconhecimento do agenciamento dos próprios filhos é sempre e a priori precário, contingente, parcelar e parcial, porque o oposto disso ameaçaria os planos dos adultos.

Mas porque se considera a figura da Criança como incapaz, incompleta e, portanto, não-verdadeiramente-Cidadã, é preciso reduzi-la a Criança-Objeto. Objeto de gestão adulta, objeto e veículo de preocupações de adultos sobre adultos para adultos. E quando essas Crianças-Objeto fogem ao controlo, quando crescem em desalinhamento com os planos (adultos) – de heterossexualidade reprodutiva cisgénero – o que se segue é sofrimento, incompreensão e, às vezes (demasiadas vezes!), a morte.