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Um olho no facho, outro no liberal

Os liberais enchem a boca com a palavra liberdade, fingindo acreditar mesmo que é um valor absoluto para todos. Só há liberdade a sério quando houver paz, pão, habitação, saúde e educação. Quem só tem ideias e propostas para afastar cada vez mais o povo desta liberdade assim sonhada não está com certeza a defendê-la para a grande maioria da população.

Crónica 74
27 Abril 2023

Diziam alguns cartazes no desfile do 25 de Abril, dia mais bonito do ano: “um olho no facho, outro no liberal”. E não podiam estar mais certos. É que se há uns que querem voltar mesmo ao antes de Abril, há outros que lutam muito para que Abril se continue por cumprir para tantos.

Os liberais enchem a boca com a palavra liberdade, fingindo acreditar mesmo que esta é um valor absoluto para todos e não é condicionada por vivermos em sociedade (esse conceito pelo qual eles também não têm propriamente apreço), mas sabendo perfeitamente que o que defendem é a liberdade máxima para poucos, e uma liberdade cada vez limitada para todos os outros. É que se só há liberdade a sério quando houver paz, pão, habitação, saúde e educação. Quem só tem ideias e propostas para afastar cada vez mais o povo desta liberdade assim sonhada não está com certeza a defendê-la para a grande maioria da população. Quando se é patologicamente obcecado com a liberdade individual estar sempre acima do bem comum, com o imposto ser roubo (mesmo quando serve para trivialidades como, sei lá, escolas e hospitais), com o mercado a auto regular-se, e com a crença de que a lei da oferta e da procura é mais real que a lei da gravidade, está-se conscientemente a lutar para que a grande maioria das pessoas tenha uma vida cada vez mais miserável enquanto paga para os de cima nadarem em riqueza (que não vos dá imortalidade, filhos, às vezes é preciso lembrar).

Por isso, acho sempre trágico-cómico quando vão ao desfile do 25 de Abril, principalmente quando nem sequer conseguem dizer “25 de Abril sempre”, sem dizer “fascismo e comunismo nunca mais”. Sabemos que alguns dos que o dizem, sem o 25 de Abril, seriam latifundiários e estariam óptimos. Mas muitos outros seriam miseráveis, como todo o povo, se o comunismo não tivesse o papel fulcral que teve para que hoje possamos viver na tão aclamada liberdade. Já agora, perguntei a um amigo meu liberal (vêem como não sou liberalofóbico? Até tenho um amigo que é) o que era comunismo. Disse-me que era o “caminho para o socialismo”, e eu ainda lhe expliquei que a ordem estava trocada, e depois disse que era “tudo ser de todos”, e eu aí desisti. Não dá para falar sobre biologia quando uma das partes achava que as baleias são peixes.

Outra coisa ainda que ficou na cabeça foi Rui Tavares ter acabado o seu discurso a dizer convictamente que caberá a todos não deixar o fascismo passar. Foi aplaudido entusiasticamente por toda a gente no parlamento, menos o Chega… e a Iniciativa Liberal, surpreendendo apenas que não anda atento.

Com isto não digo que são fascistas como os outros, digo é que lhes importa muito pouco o fascismo, desde que possam servir-se do capitalismo selvagem (passe o pleonasmo) para encher o rabo de dinheiro enquanto cospem nos pés dos pobres.

O povo não é burro, ao contrário do que eles possam pensar. Portanto, seguimos com um olho no facho e outro no liberal.

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