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É uma pena os jovens não se preocuparem com a crise climática

Um jovem preocupado com alterações climáticas, desigualdade económica, luta antirracista, feminista ou pelos direitos LGBTQIA+, como se tudo isto até estivesse ligado? Nunca foi visto.

Crónica 74
4 Agosto 2022

Finalmente alguém pôs o dedo na ferida: quase todos os jovens são uns irresponsáveis relativamente inúteis à sociedade. Já desenvolvo.

Para já, convém definir o que são jovens. São os portadores de cidadania (não imaginam o trabalho que me deu escrever desta forma woke) cujas idades são compreendidas entre os 15 e os 35, mais coisa menos coisa. Portanto, millenials e geração Z.

Claro que além da idade há outras coisas que podem definir o que é ser-se jovem. Em muitos casos, pode ser o facto de, por falta de condições financeiras, ainda se viver com os pais. Com o preço das rendas e o custo da vida no geral, por este prisma ser jovem está já a chegar aos 40 e poucos. Outra característica é-o por oposição: não ter lugar no palco do comentariado português. E bem, porque, lá está: inúteis.

Ultrapassado o introito, vamos ao que nos traz a esta crónica.

Há dias, no programa “Eixo do Mal”, falava a Clara Ferreira Alves, a autoproclamada rainha do cancelamento por parte “dos trans”: entenda-se por “os trans” como uma massa única e amorfa, que não são bem pessoas, e por cancelamento ter uma coluna de opinião semanal num dos maiores jornais do país, e um lugar num painel de um programa visto e ouvido por milhões ao longo dos anos, e volta e meia ser criticada.

Dizia ela que era uma pena que os jovens andassem só preocupados com o sexo fluído em vez de com as alterações climáticas. Até me levantei do sofá para aplaudir, e reitero: finalmente alguém pôs o dedo na ferida. É que tirando os milhares e milhares de jovens que se organizam em manifestações na Greve Climática, os que fazem partes de associações como a Climáximo, os que fazem parte de juventudes partidárias com preocupações ambientais, e todos os outros que promovem palestras ou outras ações de mobilização e sensibilização para o tema, não há um único que faça alguma coisa.

Tudo isto é ainda mais trágico quando comparado com a geração da Clara, que tem feito enormidades na luta contra as alterações climáticas. A própria Clara, se não estou em erro, já foi vista duas ou três vezes a reciclar, cinco vezes a andar a pé uma distância superior a 7 minutos, e não querendo estar a exagerar, pelo menos uma vez a usar uma palhinha de papel. Se isto não é fazer algo pelo ambiente, não sei o que será.

Por outro lado, assumindo que nem todos os jovens são completamente inúteis, é indefensável que só se consigam preocupar com um assunto de cada vez. E assim sendo, muitos deles só estão preocupados com o sexo fluído, que é aquele sexo que se faz todo suado. Costuma mais falar-se em género fluído, quando alguém se identifica como não-binário, mas a Clara conhece mais os do sexo fluído. Deve ter lido na Bravo.

A verdade é que, enquanto se preocupam com estas parvoíces identitárias e sexuais, não se conseguem preocupar com mais nada. Um jovem preocupado com alterações climáticas, desigualdade económica, luta antirracista, feminista ou pelos direitos LGBTQIA+, como se tudo isto até estivesse ligado? Nunca foi visto. Eu sei que é duro de ouvir, mas é verdade é que para os jovens todas estas lutas são mutuamente exclusivas, sendo que ainda por cima escolhem quase sempre, como já sabemos, a fluidez sexual.

Felizmente para a sociedade, ao contrário dos jovens, temos todo o comentariado nacional (todos brancos com mais de 50 anos e bastante bem instalados na vida), que tem a brilhante capacidade de se preocupar com todos os assuntos ao mesmo tempo. Não fazem nada em relação aos assuntos, mas fazem o mais importante de tudo, que é dizer aos outros: olhem, há aqui preocupações preocupantes, e preocupa-nos que vocês não se preocupem com elas.

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